Frodo e Sam com o Um Anel
“Bilbo estava designado a
encontrar o Anel, e não por quem o fez.” Gandalf a Frodo, em “A Sociedade do
Anel”.
O título dá forma a uma
pergunta que já deve ter sido feita por vários leitores, fãs e iniciados da
obra-prima de J.R.R.Tolkien:
Por que Tolkien escolheu
o anel como objeto em torno do qual giraria sua narrativa?
Desde os primórdios, os
anéis são artefatos comuns a todos povos e civilizações humanas, confundindo-se
com seu próprio surgimento, com as mais diversas utilizações, representando
ligações entre pessoas, poder, títulos, recompensas ou simples objetos de
adorno.
Talvez exatamente por ser
uma peça antiga, os anéis logo passaram a ser associados a poderes mágicos,
transformando-se em “talismãs” e carregando outros poderes sobrenaturais, de
acordo com a crença de vários povos.
Já na antiguidade, o
filósofo grego Platão narra a lenda do “Pastor de Gyges”, o qual encontra por
acaso um cadáver com um anel que ele toma e logo descobre que lhe dá o poder da
invisibilidade.
Na mitologia nórdica e
anglossaxã, cuja tradição oral foi vertida em escrita após a cristianização dos
povos do Norte europeu, textos como o germânico Nibelungenlied e o
nórdico Edda, por exemplo, mencionam o “Anel dos Nibelungos”, artefato
mágico forjado pelo anão Alberich, quem é levado à presença do deus Odin
e despojado dele (curiosamente, o anão o chama de “meu precioso”, e amaldiçoa
com a inveja e a perdição seu novo dono, pois ele o considerava seu maior bem).
Com o anel numa das mãos, Odin se sente dono de uma força nunca antes sentida,
e é tomado por uma enorme afeição por ele, ignorando as tragédias que ele daria
causa.
Como estudioso dos mitos
europeus, especialmente da Escandinávia, é evidente a influência do imaginário
nórdico na criação dos Anéis de Poder na literatura de J.R.R.Tolkien.
Em sua literatura, os
anéis de poder foram forjados durante a Segunda Era, quando Sauron, o qual
ainda possuía um corpo físico com aparência não hostil, conseguiu aproximar-se
dos elfos do reino de Eregion, estreitando relações com seus ferreiros.
Sob influência de Sauron,
os ferreiros de Eregion atingiram o auge do conhecimento em seu ofício, quando
então os Anéis de Poder começam a ser forjados, no ano de 1500 da Segunda Era. São
confeccionados nove para os reis humanos, sete para os reis anões, e três para
os senhores élficos, os quais os recebem como “presentes” de Sauron com o
engodo de que lhes dariam magicamente poder e prosperidade.
Assim, em 1600, Sauron
forja secretamente o Um Anel em Orodruin, a Montanha de Fogo, em Mordor
(onde Frodo posteriormente o leva para destruição), para através dele comandar
e dominar através dos outros anéis seus respectivos donos. Neste mesmo ano, Celebrimbor,
senhor de Eregion e quem ajudou a forjar os anéis, percebe tardiamente as
intenções de Sauron, de modo que os três anéis élficos são escondidos e
inicia-se a guerra entre os elfos e Sauron. Celebrimbor é morto, Eregion é
devastada, e Moria, o reino anão vizinho, fecha seus portões.
O terror de Sauron nesse
período só é contido quando Tar-Minastir, rei de Númenor, um
poderoso reino humano situado no além-mar a oeste, envia uma frota para
combatê-lo. Após sua derrota, Sauron concentra suas forças no leste, onde já
havia edificado sua fortaleza Barad-dûr quando forjou o Um Anel,
consolidando o reino sombrio de Mordor.
Aproximando-se de mais um
filme da trilogia “O Hobbit”, será discorrido a seguir sobre a relação de dois
de seus principais personagens com os anéis de poder de Sauron.
O anel de Gandalf
É um fato nem sempre
lembrado ou conhecido por muitos, mas Gandalf tinha um anel mágico, apesar de
ter recusado o Um anel, mesmo diante da oferta de Frodo, para que o guardasse:
“Não me tente! Pois não quero
ficar como o próprio Senhor do Escuro. Mas o caminho do Anel até meu coração é
através da piedade, piedade pela fraqueza e pelo desejo de ter forças para
fazer o bem.” (A Sociedade do Anel).
(Já o outro mago Saruman, como é sabido, cobiçava o anel particular de Sauron,
não se importando com toda maldade que ele carregava e gerava, a fim de saciar
sua sede de poder e domínio).
Gandalf chegou à Terra
Média após o primeiro milênio da Terceira Era, quando os poderes das Terras
Imortais decidiram enviar mensageiros, os Istari (magos) para fazer
frente ao poder de Sauron, que mesmo derrotado durante o Cerco de Barad-dûr
(3434-3441 da Segunda Era), começava a ameaçar novamente a Terra Média tentando
recuperar seu poder através do Um Anel cortado de sua mão pelo rei humano Isildur.
Assim, Saruman e Gandalf,
“o Peregrino Cinzento”, eram considerados os maiores dentre os cinco magos
enviados. Ao chegar aos Portos Cinzentos, no litoral oeste da Terra
Média, Gandalf foi recebido por Círdan, o elfo senhor dali, quem
“enxergava mais longe e mais fundo que qualquer outro na Terra Média”,
oferecendo-lhe um anel, dizendo:
“- Tome este anel, Mestre – disse
ele, pois seus trabalhos serão árduos; mas ele irá ajudá-lo na cansativa missão
que você tomou para si. Pois este é o Anel de Fogo, e com ele você poderá
reacender corações num mundo que se esfria.”
Tratava-se nada menos do
que um dos três Anéis de Poder dados por Sauron aos três maiores dos eldar, a
raça élfica: Gil-galad (morto durante o cerco a Barad-dûr), Galadriel
(Senhora de Lothlórien) e o próprio Círdan, quem em sua profunda
sabedoria soube como reverter o feitiço de Sauron contra ele mesmo ao enxergar
em Gandalf seu imenso desejo de fazer o bem entregando-lhe o anel.
Vale observar que os
anéis élficos não corromperam os elfos e nem eram totalmente maléficos porque
não foi Sauron quem os fez, nem sequer os tocou, e sim os próprios elfos de
Eregion. Ainda, eles foram preservados quando Celebrimbor descobriu os planos
de Sauron e fez com que fossem escondidos a tempo. Contudo, o Um Anel ainda
teria influência sobre eles, se Sauron conseguisse resgatá-lo e ampliar seu
poder maligno.
O anel de Thorin
Por direito, Thorin
era o dono de um dos anéis forjados por Sauron para os sete reis anões, uma vez
que era descendente de Durin, o senhor de uma das sete casas anãs.
Quando Sauron percebeu
que os anéis mágicos eram inúteis em seu intento de dominar a raça anã, a qual
devido à sua natureza não poderia ser transformada em sombras nem controlada
(outro fracasso de sua estratégia de dominação), o Senhor do Escuro logo tratou
de perseguí-los para tomar-lhes os anéis, cujo efeito neles apenas aumentava
sua ambição por metais e os enriquecia.
Quatro deles já haviam
sido perdidos, derretidos pelo fogo dos dragões que pilharam os grandes
tesouros dos anões um por um. Dentre os três que restaram, um pertencia à Thrór,
avô de Thorin, quem o repassou a Thráin, seu filho, antes de partir para
Moria e lá ser morto pelo orc Azog.
Após terem vingado Thrór
na longa guerra contra os orcs, Thráin juntamente com o filho Thorin e os
sobreviventes de Azanulbizar retornam à sua vida de exílio, posto que Erebor,
seu reino, fora tomado pelo dragão Smaug.
Certo dia, Thráin decidiu
partir em direção a Erebor juntamente com poucos do seu povo (Thorin não fora
incluído). Quanto mais se aproximava de seu destino, mais obstáculos e
adversidades eles encontravam pelo caminho, pois Sauron descobrira de algum
modo que Thráin tinha um dos três anéis restantes e colocou suas forças à sua
espreita. Assim, em um dado amanhecer, seus seguidores deram pela sua falta, e
muito procuraram e chamaram-no, sem sucesso, quando finalmente decidiram
retornar.
Thráin fora capturado por
agentes de Sauron e levado para Dol Gudur, onde prenderam-no e
torturaram-no até a morte, tomando-lhe o anel mágico.
Assim Thorin perdeu o pai
e o único tesouro que restava de seu reino.
Quanto aos outros dois
anéis mágicos, acredita-se que eles jazeram sob os escombros de Barad-dûr,
quando Sauron fora definitivamente destruído juntamente com o Um Anel. Seja
como for, com a destruição de Sauron e seu Anel, todos os outros perderam o
poder.
Mas a perda do anel
tampouco pode ser vista como desvantagem para Thorin: o anel apenas atiçaria a
sua cobiça, e lhe traria tragédias semelhantes às de seu avô e de seu pai.
Livre da maldição do anel presenteado por Sauron, Thorin ficou livre para
seguir o que seu coração realmente queria, com força suficiente e natural:
reconquistar Erebor, feito que teria grande peso no futuro da Terra Média ao
restaurar um grande baluarte contra Sauron (ver post “Como Thorin e os anões
salvaram a Terra Média”).