TOLKIEN: AS
DIFICULDADES DE “PINTAR” UM MUNDO
Sobre as obras do escritor inglês J.R.R. Tolkien, só pode
haver consenso sobre o fato de que as estórias que se desenrolam na “Terra
Média” apresentam uma riqueza ímpar de detalhes.
Não por acaso, conceber um mundo desde os mitos de sua
criação até os vários seres que o habitam com seus variados costumes e línguas,
preencheram intensamente quase toda a vida do escritor, incansável no seu
processo de criação e revisão.
Contudo, por mais que certamente quisesse, Tolkien não podia
permanecer imerso em sua “Arda” (a Terra) quando os eventos do mundo real
exigiam sua atenção e mesmo sua presença arriscada e a contragosto.
Tudo começou nas trincheiras da Primeira Guerra Mundial (1914-1918),
quando, doente no hospital de campanha do Exército britânico, começou escrever
“O Simarillion” (criação de Arda, suas raças, revoluções e conflitos até os
dias da Terceira Era, quando se passa “O Senhor dos Anéis”) e também esboçar os
idiomas élficos.
Tolkien manteve seu
ritmo durante os anos de crise econômica mundial na década de 30, quando
publicou “O Hobbit”.
E, notavelmente
durante a Segunda Guerra Mundial (1939-1945), época em que seu país era
destruído pelos constantes bombardeios nazistas, além dos rigores que o esforço
de guerra britânico impunham, o autor finalmente concluiu sua consagrada
trilogia na década de 50.
A vida criativa do autor não foi permeada apenas pelas
dificuldades históricas da humanidade, mas também por problemas de ordem pessoal,
sempre vencidos pela sua tenacidade e paixão pela sua arte.
Apesar de declaradamente não gostar de alegorias (histórias
simbólicas), especialmente no que dizia respeito à sua literatura, Tolkien
escreveu um conto em que retrata através de seu personagem principal os dramas
e impasses que vivenciou enquanto escritor e desenhista (sim, Tolkien também
fazia desenhos sobre o que escrevia).
“Leaf by Niggle”, ou “A folha de Niggle”, fala sobre um
pintor anônimo, Niggle, que pretende desenhar uma árvore folha por folha,
minuciosamente, até ser absorvido por outros detalhes, como a floresta ao redor,
tornando o desenho mais complexo e exigindo cada vez mais dedicação de Niggle.
Entretanto, ele adoece e é levado para uma instituição onde
precisa se envolver com afazeres alheios ao seu projeto pessoal de desenhar.
Tolkien reconhece a sua relação com o personagem de Niggle
em uma carta a Caroline Everett, em 24 de junho de 1957, quando admite a mesma busca
por riqueza de detalhes e obstáculos para concluir “O Senhor dos Anéis”.
Amante de árvores, Tolkien intitulou o conto inicialmente
como “The Tree” (A árvore). Escrito entre 1938-39 e publicado em 1945, A folha
de Niggle é mais comumente encontrado no livro do autor “Tree and Leaf” (Árvore
e Folha), ou em coletâneas de ensaios e poemas curtos de Tolkien.
Através de guerras e dificuldades pessoais, Tolkien “pintou”
um mundo maravilhoso, em todos aspectos.
Certamente, aqui se observa um novo consenso: valeu a pena.
Testando...
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